Por Vinícius Fernandes / ZH
Quem pensa que só de glamour e inspiração vive um artista não conhece os caminhos da graduação em Música, Teatro ou Artes Visuais. Antes de chegar ao vestibular da UFRGS, há de se enfrentar uma prova específica, cuja aprovação passa por um rigoroso time de avaliadores.
– Não é um curso de iniciação, mas de formação de profissionais de nível superior. Exigimos do aluno que ele tenha conhecimento básico – resume o professor do bacharelado de História da Arte e vice-diretor do Instituto de Artes da UFRGS, Paulo Gomes.

Artur Boutros cronometra cada exercício para se adaptar aos 15 minutos de que irá dispor no exame real Foto: Ricardo Duarte / Agencia RBS
Quando a UFRGS implantou os exames, os índices de reprovação eram altos, havia pouca informação sobre a estrutura da prova e os aventureiros quebravam a cara na avaliação da banca. Atualmente, escolas fazem simulados e têm professores exclusivos para a preparação de vestibulandos.
– Trabalhamos para orientar esses alunos a direcionar os esforços para o que a banca valoriza – relata Cynthia Geyer, diretora da escola Estação Musical.
Candidatos não aprovados na prova concorrem no vestibular à segunda opção de curso, indicada no ato da inscrição. As provas específicas ocorrerão em Porto Alegre entre 3 e 7 de novembro.
O hobby de hoje vira ganha-pão amanhã
Artur Boutros, 24 anos, cresceu com um hábito: reproduzir no papel tudo que via de interessante. Há poucos anos, descobriu que poderia ganhar a vida com seu traço preciso. Por isso, destina uma hora por dia para aprimorar técnicas aprendidas em sala de aula.
– Tenho dedicado meu tempo livre para passar na prova específica de Artes Visuais. Pego um objeto qualquer, faço um desenho de observação e faço os planos. Eu cronometro tudo – relata.
Diretor da OCA Escola de Arte, Paulo André Frydman considera a teoria importante, mas lembra que é elementar apresentar habilidade e versatilidade para reproduzir os mais variados objetos:
– A banca quer ver como a pessoa enfrenta o desafio em um tempo razoável, dando certas referências a características do desenho. Vão querer ver a variedade no modelo de representação, saber se o candidato pode dar ênfase para as manchas, ou para as linhas.
Boutros sabe que enfrentará um teste rigoroso, mas está confiante. Quando concluir o curso de Artes Visuais, planeja dar aulas.
– Notei a importância das aulas na preparação para a prova. Percebi que as observações da professora me deixavam nervoso, mas me faziam aprender muito – justifica o vestibulando.
Artes visuais
> Como é o teste: é aplicado em grupos e estruturado em quatro etapas. O candidato tem 15 minutos em cada etapa para fazer um desenho a partir de um modelo determinado, apresentando uma visão geral de objetos de natureza morta, como frutas, garrafas, pelúcias, tecidos dispostos sobre uma mesa. A folha é trocada para cada desenho. O tempo que sobra de uma etapa não acumula para o desenho seguinte. O uso de borracha é proibido.
> Dicas: tome cuidado para não fazer um desenho pequeno demais em relação à folha. Espaço branco entre o desenho e as bordas da folha pode ser bom, mas quando o vazio ocupa mais que 2/3 da área total significa que o desenho é pequeno. Aproveite as características dos objetos, sombras, superfícies e bordas como estímulo para o tipo de linhas, sombreamentos e texturas que irá fazer. No desenho seguinte, privilegie objetos diferentes.
Com os dedos (e nervos) afiados
Ariane Azambuja trabalha para não sucumbir ao nervosismo. A jovem de 18 anos, que hoje cursa Design de Games, mira no curso de Música Popular da UFRGS, com o plano de graduar-se como professora de violão. Toca o instrumento desde os sete anos, mas assume que, quando deparar com uma banca de quatro professores, a ansiedade deverá bater.
– Sou tranquila na maior parte do tempo, mas acho que na hora vou ficar nervosa. É bem difícil não ficar – porque não sou nenhum prodígio na música – tocando para pessoas que sabem muito mais que eu e estão lá para me julgar. Não será fácil – prevê.
Para driblar o emocional, Ariane estuda diariamente. Faz aulas de violão uma vez por semana e, em casa, além de praticar, lê sobre teoria musical. Na prova, sabe que terá de demonstrar capacidade de improviso, conhecimento e segurança com as cordas.
– Querem alguém que já tenha noção musical. Por causa da faculdade, a rotina fica corrida, mas todo o dia eu estudo, nem que seja uns 30 minutos – conta.
Murilo Bordignon, 19 anos, contraria o receituário, que prevê dificuldades na prova aos que tiveram contato tardio com a música. Quatro anos atrás, tinha noções básicas de teclado. Aos 16 anos, escolheu fazer música, mergulhou no tema e passou na prova específica na primeira tentativa. Hoje, cursa o segundo semestre de Bacharelado em Música com habilitação em regência coral e atribui o sucesso no exame à tranquilidade com que o conduziu.
– Foi até uma surpresa. Eu fiz como um teste, queria saber como era a prova, o nervosismo. Você se assusta por ser prático, mas fiz tranquilo, sabendo que podia estudar mais, que não era o melhor de mim, mas era o que eu podia passar – relembra.
Música
> Como é o teste: é constituído de duas etapas: a do instrumento escolhido pelo candidato e o teste teórico-perceptivo. Na primeira, os candidatos executarão quatro músicas – duas escolhidas por eles e duas apresentadas pelos avaliadores. Para essas músicas, os candidatos recebem, na hora, as partituras. Na segunda etapa, a prova escrita avalia conhecimentos de teoria, leitura e percepção.
> Dicas: ter bom domínio do instrumento escolhido pelo candidato é pré-requisito para ser aprovado pela banca, mas não o suficiente. Como há uma etapa teórica, é importante que o vestibulando conheça bem períodos musicais relevantes. A UFRGS oferece cursos de teoria e prática musical ministrados por alunos da faculdade, que já passaram pela prova específica e podem dar boas dicas.
Para atuar bem
Nathalia Gomes deixou a serra gaúcha para mergulhar nas artes cênicas. Em Caxias, esgotou todas as possibilidades de aprendizado e se entediou com a ausência de grandes espetáculos na cidade do Interior. Aos 20 anos, faminta por conhecimento, veio estudar teatro em Porto Alegre e espera, a partir de novembro, passar na prova específica de Artes Dramáticas e ficar de vez na Capital.
A vestibulanda faz o curso de formação de atores da Casa de Teatro quatro vezes por semana, assiste a peças com frequência e lê sobre o tema. Para ela, essa rotina a torna capacitada para a prova específica. Seu receio é escorregar na estapa seguinte.
– Sou horrível nas exatas, meu medo é não passar nessas provas. A prova específica vai me deixar nervosa, vou ficar diante de críticos e encenando sozinha, mas estudo teatro quatro dias por semana e aqui (em Porto Alegre) aprendi outras técnicas que me ajudaram muito – relata a estudante, que teme fazer uma apresentação tediosa para a banca.
– Presto muita atenção no corpo, como ele se torna presente, e em usar várias entonações, para não ficar algo monótono e parado.
A expressividade dos movimentos foi o que imprimiu realismo à atuação de Cissa Madalozzo, 29 anos, e convenceu a banca de avaliadores a aprová-la no teste específico. Foi em 2014, quando encenou um trecho da peça Gota d'Água, escrita por Chico Buarque e Paulo Pontes.
– Assim que fiquei sabendo (que esse seria o) texto, peguei o livro para ler e investiguei a história. A Joana (personagem da obra), na hora do monólogo, estava brava, então peguei a faca e comecei a cortar legumes enquanto falava. Isso é uma técnica legal, conseguir executar mais de uma ação ao mesmo tempo. São pequenas ações que tornam as cenas mais reais, mais naturais – receita Cissa.
Teatro
> Como é o teste: terá três partes, com 20 minutos de duração cada: monólogo, entrevista e improvisação. Neste ano, o texto para o monólogo será do dramaturgo e poeta alemão Bertolt Brecht. A entrevista é uma análise dramatúrgica da peça (disponível na íntegra na biblioteca do IA) de onde foi extraído o trecho para o monólogo. Para a improvisação, o tema é sorteado na hora.
> Dicas: é importante que o candidato leia todas as peças do autor exigido e as estude, pois as questões da entrevista são relacionadas ao texto do monólogo. É aconselhável que estude, memorize e crie a cena com antecedência, pois durante a prova o vestibulando pode ficar nervoso e, se não tiver o texto decorado, pode não demonstrar a segurança necessária para executar bem a interpretação.
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